Entrevista, na íntegra, concedida à jornalista Anny Malagolini do Jornal eletrônico campograndenews.com.br
Anny: Como havíamos conversado, a pauta é sobre o desapego. O que é realmente?
Fabrício: Para falar do desapego, vou falar primeiro do apego.
Apego é a manobra que o indivíduo faz para lidar com a “falta”. “Falta” aqui descrita como algo intrínseco ao ser humano, e não a algo que se remeta a uma doença ou “desordem emocional”.
Todos nós nos relacionamos com a falta. “Desejo” é o nome da interminável busca de preenchimento e dominação da falta; as próprias construções do ser humano – como sua identidade, as ideologias, filosofias, ciências – é um impulso à dominação do desconhecido (da falta).
Obviamente, vivemos em uma sociedade de consumo que está estruturada na falta, ou seja, no desejo. Explorando, desta forma, ao máximo esta manobra que temos por natureza.
Com incentivos massivos à “busca pela completude”, o sistema econômico envolve o indivíduo sugerindo dados para sua falta. O que acaba, na maioria das vezes, resultando em um consumismo “desnecessário”.
Nesta lógica é impossível se desapegar. Haja vista que, por natureza, temos esta predisposição a buscar o preenchimento da falta. O que seria possível, então, é trocar um “dado” apego por outro. Porém, em uma sociedade de consumo estruturada na falta que bombardeia-nos com incentivos às compras (dados materiais), fica quase que impossível se “desapegar” destes produtos (dados) sugeridos.
Após salientar esta lógica na qual estamos relacionados, é mister dizer que há ainda indivíduos que pegam carona no consumismo, se comportando compulsivamente, banalizando um comportamento. Obviamente, estes indivíduos lidam com uma direção de mão dupla, a saber, o prazer momentâneo do preenchimento e o sofrimento provocado pelas alterações nas demais relações de sua vida.
É bem provável que estes indivíduos enquanto estão banalizando um comportamento, estão evitando outras relações de sua vida. Comportam-se de tal maneira a não enfrentar o que há de “real” em sua vida; preferindo viver compulsivamente uma fantasia na qual “têm” o poder.
De fato, encarar o “real”, a falta e seu manejo para dominá-la não é uma tarefa fácil. Esta manobra política nos faz lidar com nossas próprias escolhas (desejos), ao passo que estas envolvem escolhas (desejos) de outras pessoas.
Para alguns, escolher pode ser dolorido e, muitas vezes, a melhor saída é pegar uma “carona” na sugestão alheia.
Às pessoas que estão se banalizando, consumindo compulsivamente, e que estão procurando mudar este comportamento, aconselho procurar uma ajuda psicológica a fim de obter um suporte para encarar seu “real” desejo.
Anny: Qual a dificuldade que as pessoas têm em se livrar do material?
Fabrício: A dificuldade se dá porque o material apegado representa, muitas vezes, um suporte na vida da pessoa, um significante emocional pelo qual o material é personificado.
Enfim, de qualquer maneira, o material tem um valor emocional para a pessoa que a ele se apega.
Portanto, se livrar do material seria o mesmo que se livrar do sentimento empregado a este material; mais ainda, livrar-se dele seria deixar de ter e ser o que ele representa.
Anny: E o que diferencia o desapego real do se livrar de coisas velhas, da limpeza?
Fabrício: O desapego, como lhe disse antes, está relacionado com uma identificação emocional.
Assim, o que o diferenciará será o manejo – seu processo emocional – de suas coisas, sejam velhas, sujas, antigas, ou novas.